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                                                                                                                                                          (Versión en Español)

A tecnologia genética

 



Ricardo Seldes

Membro da Escola de Orientação Lacaniana (Argentina)
Membro da Associação Mundial de Psicanálise
ricardoseldes@arnete.com.ar

Resumo:

A subjetividade contemporânea está cativa do movimento que a mergulha num mundo que, há muito tempo já relegou o ideal de natureza ao campo do romantismo. As inovações tecnocientíficas são como a proliferação de híbridos de natureza e cultura. Quando esses híbridos se produzem, as vozes da ética - provenientes de vários campos como a ciência, a política, a sociedade, a moral, a religião e a cultura - começam a elevar-se contra eles. No caso das tecnologias de fertilização assistida, a dimensão do cômico nos permite situar o real, como impossível de suportar, sem cair no gosto pela angústia da paisagem apocalíptica.

 

 



The Genetical Technology

Ricardo Seldes

Member of of The Lacanian Oriented School (Argentina)
Member of the World Association of Psychoanalysis
ricardoseldes@arnete.com.ar

Abstract:

Contemporary subjectivity lies in the movement that puts it in a world that despises the ideal of nature to romanticism. The technological innovations are as proliferation of culture and nature. When these hybrids are produced, the voices of ethics – coming from fields such as science, politics, society, moral, religion and culture - start to rise against them. In the case of assisted fertilization the dimension of comical allows us to face reality as unbearable if one does not fall for the anguish of the apocalyptical landscape.

 

 


La tecnología genética

Ricardo Seldes

Miembro de la Escuela de Orientación Lacaniana (Argentina)
Miembro de la Asociación Mundial de Psicoanálisis
ricardoseldes@arnete.com.ar

Resumen:

La subjetividad contemporánea esta cautivada en el movimiento que la sumerge en un mundo que ha dejado la ideal de naturaleza al campo del romantismo. Las innovaciones tecnocientíficas, son como la proliferación de híbridos de naturaleza e cultura. Cuando esos híbridos se producen, comienzan a alzarse en su contra las voces éticas desde diversos ámbitos, desde la misma ciencia, desde la política, la sociedad, la moral, la religión y la cultura. En el caso de las tecnologías de fertilización asistida, la dimensión del cómico nos permite situar o real, como imposible de soportar, sin caer en el gusto angustioso del paisaje apocalíptico.

 

 

Para começar a tratar este tema apaixonante talvez devamos, antes de mais nada, elucidar que caminhos percorreremos, e a partir de que perspectiva, do que denominamos subjetividade contemporânea. Subjetividade que está deslocada, conduzida, cultivada por um movimento pouco resistente que a engolfa na produção acelerada de um mundo que deixou a idéia de natureza para o campo do romantismo, da ignorância e, em alguns casos, da nostalgia. Esta maneira de situar o passado, implica que o futuro seja considerado com cuidado, como conservatório de reservas naturais, incluindo espécies protegidas. A subjetividade moderna está dominada pelo mundo de imagens, das aparências e da exibição de desgraças.

Poderia, graciosamente, avançar na direção de palavras que apontam para uma paisagem apocalíptica. Ainda que com a idéia de que se trate do apocalipse confortável, o daquelas pessoas perdidas nos pequenos e grandes gadgets do mundo contemporâneo.

Não, não me dedicarei ao gosto de angustiar-me construindo para o tema que, hoje, nos convoca a uma visão de que o mundo é impossível de suportar. Bela definição do sintoma em psicanálise em relação ao real. De todas as maneiras, não deixaremos de lado a preocupação que existe em grupos importantes da sociedade frente à idéia de uma ciência bulímica e de cientistas - talvez mais do que cientistas - de corporações econômicas ou de poderes desprovidos de critérios éticos de aplicação. O apocalipse enquanto representação existe desde sempre. O que mudou foram os meios e os agentes de sua realização.

A mesma estrutura do saber, e o alcance obtido por ele junto com a difusão de suas conseqüências, pode angustiar de tal modo, que a realidade não corresponde a tanto. Há menos de 100 anos atrás, um grande número de pessoas se suicidaram motivados pela noticias do choque entre o cometa Halley e a Terra. Não vamos nem falar sobre a invasão de extraterrestres magistralmente relatada por Orson Welles (1915-1985). Esta informação, agitou a opinião pública norte-americana, cuja dose de crença no Outro os torna uma massa de manobra fácil, modelável para os melhores e piores fins. Temos talvez aqui um exemplo situado no lugar do sujeito, confrontado com seu próprio vazio, ao culto de sua autenticidade, de seu próprio desenvolvimento, de sua expansão e de sua auto-referência. Este sujeito, claramente distinguido nesta sociedade - em que em maior ou menor grau se divulga nas sociedades vizinhas - exige um dever: o de viver e o de gozar. Esta exigência vem com tanta força que nas sociedades mais avançadas foi a causa do desaparecimento, por exemplo, do direito de se fazer desaparecer por meio do gosto com seus próprios vícios.

Não que eu seja defensor do tabagismo. Entendo que há um outro lado desta moeda: os que dizem que se deve reinventar, se assim um sujeito o desejar, os partidários do "eu tenho direito ao ar puro", por exemplo. Nós sabemos que se trata de uma ficção, haja vista que, o smog que respiramos nas grandes cidades e, especialmente entre “Corrientes e Talcahuano”[1], parece ser uma das piores concentrações do mundo. Eu disse que não iria desdobrar a longa lista de contaminações, a loucura aparece na dificuldade de uma sociedade que não sabe o que fazer com seus restos de produção, sendo ainda mais grave com seus lixos nucleares. Não sejamos ingênuos, o excesso na produção também é uma resposta ao exorbitante que aparece no apetite insaciável das demandas de consumo. O gosto pelos novos objetos é maior do que pelos tradicionais e encontramos verdadeiras comunidades compostas de consumistas, que partilham seu modo de gozo. tudo isto banhado numa enorme solidão em que cada um pode encontrar na manifestação de um desamparo igual ao seu, um consolo identificatório, como aquele que assistimos nos reality shows. Passemos então à questão da tecnologia genética.

Faz alguns anos, realizamos uma pesquisa no momento em que começava a difundir-se em nosso país[2] a fertilização assistida. Um tema que fervia na sociedade com efeitos práticos na vida das famílias. Naquele momento, eu me interessava pelo tratamento dado à questão pela psicanálise, que marca a diferença entre pai e genitor. Era evidente que o controle da natalidade, a fertilização assistida e agreguemos a genética reprodutiva, faziam aparecer a disjunção, a clivagem entre o encontro sexual e a reprodução nos seres falantes.

Salvaguardo-me aqui do perigo em reduzir o apaixonante tema da genética à clonagem de humanos. Fazer esta redução seria desconhecer o avanço singular da medicina quanto aos usos da genética, precisamente, na terapêutica. Talvez nos convenha seguir o caminho de Alan Trouson - que nos valhamos do chiste - um australiano que é um dos pais das técnicas de fertilização assistida. Agora ele se dedica à pesquisa das stem cells, células recolhidas dos primeiros estágios de desenvolvimento do embrião. Muitas vezes elas são retiradas dos embriões descartados pela fecundação in vitro. Estas têm a capacidade de gerar praticamente todos os tecidos do organismo.

Há alguns meses atrás, Alan Trouson veio a Buenos Aires. Ele explicou que era possível criar o músculo do coração, que seria capaz de curar algumas enfermidades cardíacas. Ele disse: acreditamos que poderemos curar a cegueira, a diabetes, as doenças do sistema nervoso como o Parkinson, Alzheimer e a fibrose cística. Quem poderia pensar em semelhante progresso!

Temos os que garantem que dentro de alguns anos a medicina alcançará a cura de diversos tipos de câncer. E isto, apenas para mencionar alguns usos da tecnologia genética. Mas, ainda temos o temor, o mal-estar. Os exercícios feitos com as raças no século passado nos fazem supor que a genética poderá ser a vilã da história porque poderá criar os espécimes que Aldous Huxley (1894-1963) descreveu nas primeiras décadas do século. Esta que nos angustiaram até nos inteirarmos que se tratava de sua metáfora anticomunista. Porém, a advertência não é contra os avanços cientificas, e sim sobre os usos que podem ser feitos pelos aparatos do poder, seja ele político ou econômico-corporativo. A criação de um exército de clones, foi um dos temores sentidos por todos, mas vejam o absurdo! Quem precisa de um exército de pessoas que podem ser destruídas por alguns aviões? Ou como Saramago dizia ironicamente numa entrevista dada na Internet na época do lançamento de seu livro: "O homem duplicado": se já somos seis bilhões de pessoas no mundo, para que clonar mais gente?

A importância dada pela sociedade à fertilização assistida, foi deslocada para a terapêutica, primeiramente dirigida ao uso de embriões congelados. Sabemos que os êxitos são menores que os fracassos. Estes embriões que eram descartados, podem, agora, ser melhor utilizados pela terapêutica já existente e pela por vir.

Durante o século XX, no auge dos desenvolvimentos sociais, produziu-se uma filosofia humanista da tecnologia. Ela identificava a tecnologia moderna no âmbito da produção e no uso de artefatos materiais. Inclui tanto os procedimentos, métodos, processos implicados, quanto os artefatos em si. A advertência feita por esta corrente era a de que o desenvolvimento da tecnologia moderna iria contra os grandes êxitos culturais, colocando em risco os valores humanos superiores incluindo a essência mesma do homem.

Promove-se um programa filosófico que desconfia da tecnologia e tende a frear ou interromper o desenvolvimento tecnológico. Carl Mitchan, é um de seus defensores. Temos uma corrente contrária encabeçada por Bunge. Eles defendem que o desenvolvimento tecnológico não representa nenhum perigo para a cultura, pelo contrário, é a chave do progresso humano.

A interpretação feita pela filosofia tenta integrar a ciência e a técnica como componentes da cultura ocidental contemporânea, separando-se com John Dewey da idéia da redução tecnologia ao âmbito dos artefatos materiais. Considerando-as como fazendo parte do conjunto das capacidades humanas, incluídas entre os progressos culturais, tal como a linguagem, a lógica e a filosofia como formas de organização social e política.

Depois da segunda metade do século XX, assistimos ao desenvolvimento das tecnologias como forma de vida. As inovações tecno-cientificas moldaram o modo de vida, tanto na esfera material quanto na interpretativa e valorativa. Chega-se a falar das tecno-ciências deixando de lado a separação entre elas. É verdade que todo este progresso, gerou outras complicações. Manuel Medina[3], em um texto muito bom, chamado "Ciência - tecnologia - cultura do século XX ao XXI", caracterizou as inovações cientificas como a proliferação de híbridos.

Estes surgem do enredo-confusão das divisões essencialistas e consistem em produtos entremeados de ciência, tecnologia, política, economia, natureza, direito e certamente da ética. Quando estes híbridos se produzem, se implantam, começam a levantar as vozes éticas contra eles, vindas de diferentes lugares, desde a ciência, a política, a sociedade, a moral, a religião até a cultura.

Quais são os híbridos mais comuns hoje? Os implantes eletrônicos no cérebro, a clonagem de animais, o congelamento de embriões humanos, as pílulas abortivas e pós-coito, o Viagra, os psicofármacos como o Prozak, os circunvizinhos da realidade virtual, produzidos pelos computadores, internet, etc. Mas em que lugares de nossas vidas estão eles, mais ou menos presentes? Desaparece a demarcação da natureza, tecno-ciência e cultura como sistemas fechados de objetos puros e, por sua vez, eles vão se delimitando mutuamente. Em tempos de Projeto de Genoma Humano, pode-se pensar na natureza como um objeto manufaturado e a ingerência genética, as biotecnologias estão dando lugar à natureza extraída no laboratório e transformada em Real, na qual se instala com conservadorismo ecológico, dirigido não só a preservar como também melhorar as espécies existentes.

Qual o lugar ocupado pelo saber na ciência? Depois de tudo que expusemos aqui, podemos entender que a ciência não é uma leitura da natureza e sim um saber da ciência que se posiciona de forma a determinar o real. Quer dizer que este discurso implica, não somente, que se possa aceder ao real, senão que se o toque, o transforme. Os que se dedicam à genética dizem que os avanços não atingirão o homem, mas sabemos como o toca e como o tocará. Sabemos que nem os comitês de ética, nem as leis deterão a proliferação de seus objetos humanos.

 

Quanto à psicanálise

Não precisamos dar um tom trágico ao acontecimento, mas é necessário verificar que intervenções farão os analistas junto a este modo de funcionamento da sociedade pertinentes à época. Lacan sempre relevou o aspecto cômico e o coloca como a saída possível pelo lado do chiste. Entretanto, são saídas para o quê?

O discurso da ciência dá a ilusão de um domínio do real que inclui duvidar dele mesmo. Se se coloca o saber e o real como sendo a mesma coisa - o que orienta a prática da psicanálise é o real. O sintoma enquanto é aquilo de que se sofre, não se reduz a um saber no real, e sim a um sentido no real.

Não vou me deter sobre este ponto. Vou me dedicar a vê-lo pela vertente do cômico.

Tomemos o aspecto finório desta história. Pensemos: quem seriam os candidatos humanos a serem clonados?

Por exemplo: casais que desejam ter um filho, mas por algum motivo não podem porque um dos dois é estéril ou porque se trata de dois indivíduos do mesmo sexo. Suponhamos que o fato de não poderem ter filhos pelas vias normais, os leve a querer clonar um filho. Seria simples entrar num acordo sobre qual dos dois seria escolhido para ter sua réplica? Clonamos a mim, ou a você? Não quero nem imaginar o momento em que teremos que receber nos consultórios pessoas que tragam este tipo de questão! Eu gostaria que fosse ela a clonada porque não desejaria colocar no mundo alguém tão inseguro, ou tão míope quanto eu. Ou, ao contrário, sujeito tão narcísicos que querem ter a si mesmo várias vezes. Escutei falar que existe um banco de espermas daqueles que receberam prêmio Nobel com finalidades de reproduzir e duplicar gênios. Eles acreditam que clonar gênios faria com que uma sociedade repleta deles fosse muito melhor do que é atualmente.

Suponhamos um homem que ama uma mulher. Por que não quereria tê-la, alguns anos mais jovem do que é? A dimensão do cômico suscita este modo de situar as coisas. Obviamente, aponta para o falo, que a esta altura parece um pequeno apêndice excedente, que podemos esquecer que seja necessário para a reprodução humana.

Como dizíamos no começo, isto tem um porquê: a disjunção entre o real da sexualidade humana e a reprodução animal, que mostra a ausência de uma pulsão reprodutiva no inconsciente. Como neste lugar há um buraco fundamental, então algo aparece no seu lugar com a função de não deixar que se escreva.

Para a psicanálise, o sintoma é isto que vem neste lugar, com um aspecto de regularidade, de lei que é particular a cada sujeito, com um aspecto de real que também é próprio a cada um. Há um saber que, ao nível da espécie não está inscrito no real, aquele que para cada sujeito se mostra em seu sintoma. Este saber que não está inscrito no real concerne à sexualidade, aquele com a qual cada um se arranja como pode. Com este acontecimento uns se viram melhor que os outros.

Ao nível dos animais, encontramos o instinto que dirige de forma típica e invariável a escolha do parceiro para cada espécie. Ao nível do desejo, nos falantes se verifica que o que se coloca é mais da ordem de uma pergunta. É com perplexidade que cada um trata o problema. Sabemos que ao nível da pulsão não há nada que assegure o lugar do Outro no nível do sexual. Se há sintoma, não há saber no real que diga respeito à sexualidade.

Como é possível captar, na experiência analítica, a ausência de saber no real? Notamos nos relatos que escutamos, os que situam cada caso, aquilo que para cada sujeito implica uma função determinante na sua vida, uma desventura que o marca e pode dizer que isto não estava escrito e nem previsto. Um mau encontro diante do qual alguma instância se divide e, que nos relatos do sujeito, ele a toma como a causa de sua orientação sexual ou da falta de eleição sexual. Mas, também podemos verificar algumas palavras investidas libidinalmente, que atraem a libido e que levam o sujeito a decidir sobre os investimentos fundamentais que condicionam os modos por meio dos quais se relacionará sexualmente. O gozo sexual se apresenta sob as espécies do traumatismo, como preparado pelo saber, desarmônico com o que se apresenta ali. A contingência se mostra pela constância que captamos nestes casos. A constante é a variabilidade mesma. A variabilidade é que não há um saber, neste sentido, pré- inscrito no real. É a contingência que decide o modo de gozo do sujeito.

 

A genética é ética?

Alejandro Tomassini Bassols[4] escreve que no seu estudo sobre genética, sociedade e filosofia, o que determina os indivíduos não é um novo fenômeno, que agora podem fazer com maior esmero e de forma mais eficaz. Ele tem razão. Mas, por acaso, a contingência fica reduzida à necessidade, ao simples desejo veemente? De fato, não há saber que a reduza efetivamente com sucesso. Lembrem-se do filme sobre a mosca e aí teremos um exemplo da contingência elevada ao sujeito-mosca.

Teremos mudanças nas famílias a partir da técnica genética aplicada à reprodução humana? Sim, certamente. Serão mudanças aterrorizadoras? Não acredito. Dependerão também da contingência. Freud entende que a família é o Édipo e o motor é a castração. Cada um, clonado ou não, terá que se haver com este laço e com a neurose infantil que é a construção que o sujeito inventa para responder ao enigma sobre a relação dos pais. A novela familiar implica no ciframento em que se presentificam os desejos do pai e da mãe. A catástrofe se apresenta quando, pelas vias mais normais, o filho é produto de um não-desejo.

O Nome-do-Pai não tem que padecer da ausência da pessoa. Às vezes se padece de ume presença maciça quando, por exemplo, o pai impede a mãe de ocupar-se de seus filhos. Ele, que irá advir como sujeito, ainda que nascido pela mediação da ciência, terá que se situar na estrutura do Outro, no desejo que o gerou e implicará fazer-se responsável por ele. O que não coincide com o nascimento e é uma evidência de que os genitores podem ser substituídos.

Lacan deslocou a questão do casal, pai e mãe, para o vinculo homem e mulher. Aí se situa o abismo, este vazio que assinala a falta de simetria entre os sexos. Lacan assinalou nos anos 60 que a força do costume poderia levar mulheres revoltadas falicamente a serem inseminadas artificialmente a partir do esperma de um grande homem, não se trataria necessariamente de uma concepção de uma reivindicação fálica típica da histeria, nem a reivindicação de sujeitos sadeanos a gozar como lhes aprouver de um direito universal a tudo.

Pensamos que poderia se tratar de um anúncio profético, de uma tentativa brutal de volta de uma submissão do gozo feminino a um fundamentalismo. Como aliás, temos visto nos últimos anos. Mas, imaginemos um fundamentalismo que tenha como objetivo, por exemplo, a instalação de uma raça de grandes homens. Isto não seria um problema especifico das mulheres, nem dos pais, nem produzido por uma tecnologia genética. Se existe algo de uma histeria nisto, é porque sabemos como historicamente foi objeto de sacrifício e perseguições, até que Freud descobriu uma maneira de escutá-la, o que diminuiu parcialmente este efeito.

Se o gozo feminino é rechaçado, vemos a clara expressão da falta de simetria na sexualidade humana, nem a ignorância, nem o desvario do olhar, nem a ignorância nem a impugnação pela ciência podem mudar o que uma decisão política pode sustentar.

Para encontrar alguma resposta para isto, a análise dos sujeitos poderá juntar entre suas conseqüências, o que lhe oferece a lógica coletiva e o que a ação analítica consiga efetivar no pacto social.

Lacan se perguntava, muito no começo de seu ensino : por que os planetas não falam? Em principio, porque se deslocam e reaparecem sempre no mesmo lugar. Mas nós os fizemos falar e seria um grande erro deixarmos de nos perguntar como isto se fez possível. Durante muito, muito tempo eles arrastaram um resíduo de uma época em que tiveram uma maneira de forma existência subjetiva. Nunca se sabe o que pode acontecer a uma realidade até o momento em que, inscrevendo-a numa linguagem, a reduzimos. Só estamos seguros de que os planetas não falam, quando calamos sua eloqüência, ou seja, quando a teoria newtoniana produziu a teoria do campo unificado sob uma forma que veio a ser completada depois, mas que já era perfeitamente satisfatória para todas as mentes humanas.

A teoria do campo unificado está resumida na lei da gravitação que consiste essencialmente em que haja uma fórmula que mantenha tudo isso junto. Agora podemos lançar a perguntar: os genes falam?

O problema de saber se falam não fica resolvido pelo fato de não responderem ainda que possuam uma linguagem. Não estamos tranqüilos, um dia algo pode nos surpreender. Não caiamos no misticismo, dizia Lacan, não terminarei dizendo que os átomos e os elétrons falam. Mas, por que não?

Tudo é como se fora. Em todo caso, a coisa se demonstraria a partir do momento em que começaram a nos mentir. Se os átomos nos mentissem, se fossem espertos conosco, ficaríamos convencidos com justificativa para tal.

A comunidade analítica tem uma função a cumprir em um trabalho que ultrapassa os limites do consultório, assim como a comunidade cientifica franqueia os limites do laboratório.

Há uma voz em cada disciplina que deve ser escutada, dando razões, encontrando argumentos, opondo posições, em uma palavra, dando uma orientação contra o silêncio.

Tradução: Rachel Amin de Freitas.

Revisão Técnica: Tania Coelho dos Santos.



[1] N.T.: Referência a duas ruas na cidade de Buenos Aires (Argentina).
[2]
Argentina.
[3]
MEDINA, Manuel Ciencia-tecnología-cultura del siglo XX al XXI. Barcelona: Anthropos, 2000.
[4]
  BASSOLS, Alejandro Tomassini- Genética, sociedad y filosofia.