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Laboratório de Ensino


COMPLEXO DE CASTRAÇÃO

Alexandre Bustani Louzada  
 

Complexo de castração designa "o sentimento inconsciente de ameaça experimentado pela criança quando ela constata a diferença anatômica entre os sexos" (ROUDINESCO, E. & PLON, M, 1998: 104.) (presença ou ausência de pênis) e se centra na fantasia de amputação do pênis. Este complexo aparece pela primeira vez no texto Sobre as teorias sexuais infantis, de 1908, onde Freud observa que as crianças teorizam que todas as pessoas, homens e mulheres, possuem pênis e que a diferença sexual se faz entre pessoas que possuem pênis e pessoas que foram castradas.

É só em A organização genital infantil, de 1923, que o complexo de castração é inserido no conjunto da teoria freudiana sobre a sexualidade. Aqui ele é relacionado com o complexo de Édipo e com o estádio fálico do desenvolvimento libidinal, fase de narcísico nos órgãos genitais em que, diz Freud, a investigação sexual infantil atribui a ambos os sexos o mesmo genital masculino, não passando pela distinção sexual, que nada significa além da posse ou não do falo, que passa a ser o elemento diferencial primordial na organização genital dos sexos ("ter pênis" ou "não ter pênis"). A castração possui um grande impacto sobre o narcisismo dado que o falo é considerado uma parte essencial da imagem do eu e a sua retirada põe em risco essa imagem, constituindo uma ferida narcísica.

A estrutura e os efeitos do complexo de castração são diferentes no menino e na menina, como nos diz Freud em Algumas conseqüências psíquicas da diferença anatômica entre os sexos, de 1925. Ambos de início passam pela fase inicial da crença que não há diferença anatômica entre os sexos:

o desenvolvimento sexual de uma criança avança até determinada fase, na qual o órgão genital já assumiu o papel principal. Esse órgão genital é apenas o masculino, ou, mais corretamente, o pênis; o genital feminino permaneceu irrevelado.(FREUD, 1924: 194)

O segundo tempo do complexo de castração do menino é marcado pelas ameaças verbais dos pais contra suas manipulações auto-eróticas oriundas do seu interesse nos genitais (fase fálica) e o terceiro é o da constatação visual da região genital da menina e o que o menino vê não é a vagina, mas sim uma falta de pênis. Ele acha a idéia de seres desprovidos de pênis inconcebível e a crença de que é impossível haver seres sem pênis resiste às evidências visuais a ponto de ele crer que a menina possui um pênis, mas que é pequeno e que algum dia irá crescer. As mulheres mais velhas e respeitáveis como sua mãe possuiriam um pênis grande.

O quarto tempo é o momento de angústia, quando o menino percebe que também sua mãe é desprovida de pênis. A rememoração das ameaças verbais do segundo tempo vem conferir sua significação plena à percepção visual de um perigo até ali negligenciado(NASIO, 1989: 15.). Em um só depois é que a ameaça de castração é significada e faz efeito.

Quando um menino pela primeira vez chega a ver a região genital de uma menina, começa por demonstrar irresolução ou falta de interesse; não vê nada ou rejeita o que viu (...) somente mais tarde, quando possuído de alguma ameaça de castração, é que a observação se torna importante para ele; se então a relembra ou repete, ela desperta nele uma terrível tormenta de emoção e o força a acreditar na realidade da ameaça de que havia rido até então.(FREUD, 1925: 281.)

Sob o efeito da angústia o menino aceita a interdição da mãe enquanto objeto sexual e reconhece a lei paterna no intuito de manter seu pênis, tornando assim possível sua identidade masculina: as catexias de objeto são abandonadas e substituídas por identificações; a autoridade do pai é introjetada e dá origem ao supereu, que perpetua a proibição contra o incesto, impedindo o retorno da catexia libidinal; e as tendências libidinais são dessexualizadas e sublimadas (o que acontece com toda transformação em identificação), inibidas em seu objetivo e transformadas em afeição. Todo esse processo assegurou a permanência do órgão genital, mas paralisou-o ao remover sua função, daí o período de latência.

O término do complexo de castração é para o menino também o término do complexo de Édipo, que não é simplesmente recalcado, ele desfaz-se literalmente em pedaços sob o impacto da ameaça de castração [... ] nos casos ideais, não mais subsiste sequer no inconsciente (FREUD, 1908.). Já na menina, o complexo de castração inaugura seu complexo de Édipo que é uma formação secundária. Enquanto, nos meninos, o complexo e Édipo é destruído pelo complexo e castração, nas meninas ele se faz possível e é introduzido através do complexo de castração (FREUD, 1925: 285.).

Enquanto o menino que demora dois tempos para admitir a castração, o efeito na menina é instantâneo e a visão do pênis a obriga-a a admitir sua castração. Ela passa, então, a invejar o órgão masculino. Freud diz que

Elas notam o pênis de um irmão ou companheiro de brinquedo, notavelmente visível e de grandes proporções, e imediatamente o identificam com o correspondente superior de seu próprio órgão pequeno e imperceptível; dessa ocasião em diante caem vítimas da inveja do pênis. (FREUD, 1925:280)

A menina, a princípio, não associa a castração a todas as mulheres e acha que sua situação se trata de um infortúnio pessoal. Só depois ela percebe que todas as mulheres são castradas, inclusive sua própria mãe. Humilhação narcísica, a castração encerra o complexo de Édipo negativo da menina, criando um ódio por sua mãe por ela não lhe ter dado um pênis e um desprezo por ela mesma ser castrada. Ela se volta então para o pai na esperança de dele ganhar o pênis que lhe foi negado, constituindo o complexo de Édipo positivo. Esse desejo de ganhar um pênis acaba por ser substituído pelo desejo de ter um filho do pai.

A libido da menina desliza para uma nova posição ao longo da linha - não há outra maneira de exprimi-lo - da equação 'pênis-criança'. Ela abandona seu desejo de um pênis e coloca em seu lugar o desejo de um filho; com esse fim em vista, toma o pai como objeto de amor. A mãe se torna o objeto de seu ciúme. A menina transformou-se em uma pequena mulher. (Ibid, 284.)

Enquanto as ameaças visam o pênis, seus efeitos incidem sobre a fantasia incestuosa em relação à mãe, em outras palavras, visam obrigá-lo a renunciar à satisfação incestuosa de algum dia tomar o lugar do pai ao lado da mãe. A ameaça de castração encarna a função de Lei contra o incesto, descrita em Totem e Tabu, na qual o pai primevo reservaria para si todas as mulheres, ameaçando seus filhos de castração como pena por infringir a Lei. Enquanto o menino se sente ameaçado pelo pai em resposta às suas atividades auto-eróticas e incestuosas com a mãe, a menina sente sua falta de pênis como um dano sofrido que ela procura negar, compensar ou reparar (LAPLANCHE & PONTALIS, 1997:73).

Em Análise terminável e interminável Freud retoma a questão da castração e reconhece a impossibilidade de o sujeito renunciar completamente a seus desejos incestuosos, chamando isto de "Rochedo da castração".


FREUD, S. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro, Imago, 1996:

____ Análise terminável e interminável (1937)
____ Algumas conseqüências psíquicas da diferença anatômica entre os sexos (1925)
____ Dissolução do complexo de Édipo, A (1924)
____ Sobre as teorias sexuais das crianças (1908)
____ Totem e tabu (1930)

KAUFMANN, P., Dicionário Enciclopédico de Psicanálise: O Legado de Freud e Lacan, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1996.LAPLANCHE & PONTALIS, Vocabulário da Psicanálise - 2ª edição, 7ª tiragem, São Paulo: Editora Martins Fontes, 1997NASIO, Os 7 conceitos cruciais da psicanálise, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1989.

ROUDINESCO, E. & PLON, M.; Dicionário de Psicanálise, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.

 

 

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