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Laboratório de Ensino


CONFLITO PSÍQUICO

Roberta Guimarães D'Assunção 
 

Entende-se por conflito psíquico algo constitutivo do sujeito que pode ser descrito como a oposição de exigências internas contrárias. Freud procura, ao longo de suas construções teóricas, apresentar o conflito como um dualismo praticamente irredutível. Dessa forma, o conflito é sempre considerado e, portanto, é disposto de diferentes formas: entre desejo e censura, entre sistemas e instâncias, entre pulsões (os três momentos do dualismo pulsional) e como conflito edipiano.

O conceito de conflito psíquico é introduzido na obra freudiana em estreita relação com o processo de defesa. À medida que avança no tratamento das neuroses, Freud observa uma crescente resistência, a qual é entendida como a expressão de uma defesa intra-subjetiva contra representações inconciliáveis. Seus trilhamentos são melhor precisados na seguinte passagem, escrita em 1896:

(...) a eclosão da histeria podia ser inevitavelmente atribuída a um conflito psíquico que emerge quando uma idéia incompatível detona uma defesa por parte do ego e solicita uma repressão. Até hoje não pude estabelecer quais as circunstâncias em que um esforço defensivo desse tipo tem o efeito patológico de realmente arremessar ao inconsciente uma lembrança que está afligindo o ego e criar um sintoma histérico em seu lugar. Hoje, porém, posso reparar a omissão. A defesa cumpre seu propósito de arremessar a idéia incompatível fora da consciência se há cenas sexuais infantis presentes no sujeito (até então normal) sob a forma de lembranças inconscientes, e se a idéia que tinha de ser reprimida puder ser posta em conexão lógica e associativa com uma experiência infantil desse tipo. (Freud, 1896, p. 238)

Nesse momento, essa atividade defensiva é generalizada às outras "psiconeuroses" e atua na formação de sintomas, atos falhos, sonhos, lembranças encobridoras, etc. Em 1899, pouco antes da publicação de A interpretação dos sonhos, Freud é ainda mais claro no que se refere ao conflito entre desejo e censura ao questionar o porquê de se suprimir o que é importante e se reter o indiferente:

Impõe-se-nos então a idéia de que duas forças psíquicas estão envolvidas no processamento de lembranças desse tipo. Uma dessas forças baseia-se na importância da experiência como motivo para procurar lembrá-la, enquanto a outra força - a resistência - tenta impedir que tal preferência seja mostrada. Essas duas forças oponentes não se cancelam uma à outra, e nenhuma delas predomina (...). Na verdade, efetua-se uma conciliação, semelhante de algum modo à produção da resultante em um paralelogramo de forças. (Freud, 1899, p. 337)

Até então, o conflito era explicado a partir das observações na clínica das neuroses. A partir de A interpretação dos sonhos (1900) e dos artigos metapsicológicos (1915), o conflito psíquico pode ser compreendido ao nível tópico (entre instâncias ou sistemas) e ao nível econômico-dinâmico (entre pulsões).

De acordo com o primeiro modelo de aparelho psíquico, a oposição se dá entre os sistemas inconsciente, por um lado, e pré-consciente-consciente, por outro, o que corresponde à dualidade entre princípio de prazer e de realidade. Portanto, as duas forças conflitantes e inconciliáveis são a sexualidade e a instância recalcante. Do ponto de vista econômico-dinâmico, Freud supôs, mais tarde, o dualismo das pulsões sexuais e das pulsões de autoconservação (pulsões do ego) admitindo que a oposição entre representações é a expressão das lutas entre diferentes pulsões.

Posteriormente, com a segunda tópica, o conflito passa a ser descrito não apenas entre instâncias como também no interior da própria instância, (...) por exemplo entre os pólos de identificação paterno e materno, que podem ser encontrados no superego. (Laplanche e Pontalis, 1998, p. 90) Com o novo dualismo pulsional, das pulsões de vida e de morte, o conceito de conflito é renovado. As pulsões de vida parecem abranger as oposições entre pulsões de autoconservação e sexuais, e entre libido do ego e libido do objeto. As pulsões de morte são a própria discórdia, uma espécie de "tendência para o conflito".

Uma última análise das diversas perspectivas do conflito psíquico em função dos diferentes momentos da teoria psicanalítica nos permite verificar a seguinte constante: um dos pólos do conflito é sempre a sexualidade, enquanto que o outro pólo é modificado (ego, pulsões de ego, pulsões de morte, Pcs/Cs). De fato, Freud insiste no fato da sexualidade estar intrinsecamente relacionada ao conflito, afirmando mais tarde que o ponto fraco da organização do ego parece residir em sua atitude para com a função sexual. (Freud, 1938, p. 215)


Freud, S. - A etiologia da histeria [1896] in Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1980.

Freud, S. - Lembranças encobridoras [1899] in Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1980.

Freud, S. - Esboço de Psicanálise [1938] in Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1980.

Vocabulário de Psicanálise / Laplanche e Pontalis; sob a direção de Daniel Lagache; [tradução Pedro Tamen]. - 3a ed. - São Paulo: Martins Fontes, 1998.

Dicionário enciclopédico de psicanálise: o legado de Freud a Lacan / editado por Pierre Kaufmann; tradução, Vera Ribeiro, Maria Luiza X. de A. Borges; consultoria, Marco Antonio Coutinho Jorge. - Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1996.

 

 

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