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A histeria entre a clínica e o laço social





Julio Cesar Lemes de Castro
Pesquisador de pós-doutorado em Psicologia Social no Instituto de Psicologia / USP (São Paulo, Brasil), com bolsa FAPESP
E-mail: julio@jclcastro.com.br

Resumo

Para compreender o modus operandi do discurso da histeria, o artigo propõe-se a derivar sua montagem a partir das características e do funcionamento da estrutura clínica histérica. Para eludir o gozo, a histeria cultiva a insatisfação: a falta, na posição da verdade, não pode ser suprida pelo Outro, na posição da produção. E, ao mesmo tempo que evidencia a limitação do Outro, a histérica oferece-se para tamponá-la: o sujeito, na posição do agente, coloca-se como objeto do desejo do Outro, na posição do outro do discurso. Contudo, como laço social, o discurso da histeria não envolve necessariamente sujeitos histéricos do ponto de vista clínico. O que distingue estes últimos é o fato de aferrarem-se ao questionamento das disjunções de impotência, na linha de baixo, e de impossibilidade, na linha de cima, e, desse modo, fixarem-se na dinâmica interna do discurso.

Palavras-chave: psicanálise, histeria, discurso da histeria, estrutura clínica, laço social.

 

Formalização da teoria dos discursos

Na teoria lacaniana dos discursos, formulada inicialmente no Seminário XVII (Lacan, 1969-70), discurso é entendido como modalidade fundamental de laço social. Segundo a formalização de Lacan, cada discurso é representado por um algoritmo com quatro posições fixas. Diversos nomes são usados para designar essas posições; adotam-se aqui aqueles que aparecem no esquema usado em “Radiofonia” (Lacan, 1970, p. 447) e no Seminário XX (Lacan, 1972-73, p. 21): o agente, o outro, a produção e a verdade. Acrescentando a esse esquema as setas empregadas alhures (Lacan, 1971, p. 101; Lacan, 1971-72a, p. 111; Lacan, 1971-72b, p. 68; Lacan, 1972, p. 40), temos:

Essas posições são ocupadas por quatro elementos distintos: o significante-mestre (S1), a bateria de significantes ou o saber (S2), o sujeito barrado ou dividido ($) e o objeto a ou mais-de-gozar (a).

Como esses quatro elementos são dispostos nas quatro posições sempre na mesma ordem, temos quatro possibilidades de discurso: do senhor, da universidade, da histeria e do analista (Lacan, 1969-70, p. 31). Aplicando a cada um dos algoritmos o conjunto de setas que Lacan propõe posteriormente, e distribuindo-os espacialmente de forma a evidenciar o movimento de rotação e as relações de simetria entre os discursos, obtemos a seguinte matriz:

A esses discursos, ditos “radicais” (Lacan, 1969-70, p. 19), é acrescentado, numa alocução em Milão, um quinto, o do capitalismo, que consiste numa variante do discurso do senhor, obtida através da inversão das posições dos elementos no lado esquerdo do algoritmo e do rearranjo das setas:



(Lacan, 1972, p. 40).

Embora o discurso da histeria, como um tipo mais geral de laço social, possa caracterizar situações envolvendo sujeitos que não são necessariamente histéricos no sentido clínico, seu modelo é o da categoria nosográfica. Trata-se, aliás, do único discurso inspirado numa patologia. Por isso, para compreender seu modus operandi, é conveniente tomar como ponto de partida a estrutura clínica histérica. Por outro lado, pensar essa estrutura nos quadros da teoria dos discursos lança sobre ela novas luzes, permitindo precisar a conceitualização de Freud com base em Lacan.


Gozo e disjunção de impotência

No lado direito do algoritmo do discurso da histeria, temos a linguagem, ou seja, um conjunto de significantes (S2) organizado em torno de certos parâmetros (S1). No lado esquerdo, aparece o efeito subjetivo da linguagem – a cisão entre o sujeito barrado ($) e o objeto (a), consolidada por intermédio da castração. Alçado ao simbólico via linguagem e castração, o sujeito aparta-se do gozo, que em sua dimensão absoluta passa a ser para ele algo traumático.

Esse aspecto traumático, presente em cada um, assume um caráter específico na histeria. Freud e Breuer (1895, p. 48) detectam nela a fixação numa experiência primitiva: “Os histéricos sofrem principalmente de reminiscências”. O que está em jogo é a vivência infantil da sexualidade: “Na base da etiologia da histeria encontramos um evento de sexualidade passiva, uma experiência à qual alguém se submeteu com indiferença, ou com pequeno grau de aborrecimento ou terror” (Freud, 1896, p. 178). Ou seja, o traumatismo primitivo, “na histérica, é uma sedução sofrida, uma intrusão, uma interrupção do sexual na vida do sujeito” (Lacan, 1957-58, p. 399), ligada à sensação de algo insatisfatório, desagradável. Não se trata necessariamente de uma intervenção exterior, como chega a acreditar Freud no início, pois as próprias reações do corpo são sentidas pela criança como algo vindo de fora. Essa divisão subjetiva vem a tomar a forma da angústia de castração, na qual a integridade narcísica está em xeque. E é principalmente como temor de perder essa integridade que se manifesta a aversão estrutural ao gozo na histeria: sucumbir ao gozo traria, aos olhos do sujeito histérico, o risco da dissolução de seu ser.

Diante disso, a estratégia histérica consiste na valorização da falta, indicada pelo objeto a, que ocupa a posição da verdade no discurso da histeria. Para eludir o gozo, cultiva-se a insatisfação. Em sua discussão do caso Dora, Freud (1905, p. 107) faz uma constatação aplicável a todos os histéricos: “Se aquilo que desejam com mais intensidade em suas fantasias se lhes apresenta na realidade, eles não obstante o evitam; e abandonam-se a suas fantasias tão logo não precisem temer vê-las realizadas”. De acordo com a fórmula de Lacan (1958-59, 15/04/1959), “a histeria caracteriza-se pela fundação de um desejo enquanto insatisfeito”. Em outras palavras, o que se deseja na histeria é um desejo insatisfeito. É o caso da mulher do açougueiro, paciente freudiana na qual Lacan (1975, p. 557) reconhece o “paradigma” do funcionamento da histeria. Ela conta ter sonhado algo que aparentemente contradiz a tese segundo a qual o sonho é a realização de um desejo:

“Queria dar uma reunião onde fosse servida uma ceia, mas não tinha mais nada em casa senão um pequeno salmão defumado. Pensei em sair e comprar alguma coisa, mas me lembrei que era domingo de tarde e que todas as casas comerciais estariam fechadas. Em seguida, tentei telefonar para alguns fornecedores, mas o telefone estava defeituoso. Assim, tive que abandonar meu desejo de dar uma recepção” (Freud, 1900, vol. IV, p. 156).

Numa interpretação engenhosa, Freud mostra que a mulher do açougueiro não queria, na verdade, realizar seu desejo explícito de preparar um jantar para servir salmão defumado a uma amiga. Além disso, na análise, descobre-se que ela própria entretinha um desejo insatisfeito por caviar. “À questão ‘o que a espirituosa açougueira deseja?’, pode-se responder: caviar. Mas essa resposta é sem esperança, porque caviar é ela também que não o quer” (Lacan, 1958, p. 625).

A insatisfação apoia-se na disjunção do patamar inferior do discurso, assinalada pela ausência de seta entre as posições da produção, à direita, e da verdade, à esquerda: “No nível dessa segunda linha, não há a mínima flecha. E não somente não há comunicação, mas há alguma coisa que obtura” (Lacan, 1969-70, p. 203). O que aparece nesse ponto é a impotência: “A estrutura de cada discurso necessita de uma impotência, definida pela barreira do gozo, a diferenciar-se como disjunção, sempre a mesma, de sua produção a sua verdade” (Lacan, 1970, p. 445). Característica de todos os discursos (à exceção do discurso do capitalismo), no caso particular do discurso da histeria a disjunção de impotência opera entre S2 e a, indicando que o Outro não é capaz de dar conta da falta.

Isso significa que o sujeito, não querendo ser satisfeito, pode atribuir esse intento ao Outro, que de fato nunca poderá satisfazê-lo inteiramente. Na medida em que a fonte da insatisfação é localizada no Outro, o sujeito histérico aparece, na linha da “bela alma” de Hegel, como vítima de um mundo em desordem. No sonho da paciente freudiana a quem Lacan se refere justamente como “bela açougueira”, o desejo de que seu desejo não seja realizado é camuflado por circunstâncias fora de seu controle: não há salmão na despensa, o comércio está fechado por ser domingo, não é possível contatar fornecedores porque o telefone está com defeito. Já Dora rebela-se contra a aparente tentativa de fazerem dela peão de um jogo de interesses recíprocos, no qual seu pai, enamorado da Sra. K., faz vistas grossas às investidas do Sr. K em direção à filha.

A insuficiência do Outro diz respeito, antes de tudo, ao fornecimento de um saber sobre o objeto a, ou seja, um saber em conexão com o desejo e o gozo. No segundo sonho de Dora, seu pai morre e, em lugar de ir velá-lo, ela vai até sua casa para consultar um dicionário, o que para Freud remete a uma busca de saber sobre o sexo. Ou seja, ao endereçar-se à posição paterna em pós de um saber, Dora depara-se com alguém morto. Na verdade, essa limitação da condição paterna já transparecia no caso – seu pai era impotente – e é uma faceta da histeria – basta recordar a doença do pai de Anna O., paciente emblemática de Breuer no período pré-psicanalítico. A incapacidade do saber constituído em dar conta da histeria é uma constante ao longo da história: descrita como santa, bruxa, epiléptica etc., conforme o contexto de época, a histérica escapa sucessivamente a todas as determinações. O próprio saber do analista, na medida em que ele consente em ocupar o lugar do Outro, revela-se insuficiente, como mostra também o caso Dora, no qual Freud, que vinha de publicar A interpretação dos sonhos, esbanja confiança em seus dotes interpretativos, mas esbarra na indiferença da paciente.

A insuficiência do Outro significa que o próprio Outro também é barrado, que há uma falta no Outro – nos termos do discurso da histeria, S1, no lugar do outro do discurso, não unifica S2, no lugar da produção. O discurso da histeria desvela assim o segredo do senhor: “E essa verdade, para dizê-la enfim, é que o senhor é castrado” (Lacan, 1969-70, p. 110). Esse fato está ligado a outro: posicionar-se como senhor implica abdicar de gozo, pois não é possível ser senhor sem dominar seu próprio gozo (no discurso do senhor, o gozo está do lado do escravo). Na verdade, a própria entrada no discurso (que se dá via discurso do senhor), ou seja, no simbólico, é viabilizada pela castração, como mostra o mito freudiano de Totem e tabu. O que ocorre é que o discurso do senhor esconde a castração do senhor na posição do agente, ao situar o sujeito barrado na posição da verdade, cabendo ao discurso da histeria pô-la a nu.

A emergência da ciência moderna, ligada à derrocada das pretensões totalizantes do saber mítico e religioso, envolve justamente essa passagem do discurso do senhor ao discurso da histeria. A associação da ciência ao discurso da histeria é recorrente em Lacan: “ao inscrever a ciência no registro do discurso histérico” (Lacan, 1970, p. 431); “por paradoxal que seja a asserção, a ciência toma seus impulsos do discurso da histérica” (Ibid., p. 436); “não falemos do discurso histérico, é o próprio discurso científico” (Lacan, 1971-72b, p. 66); “o discurso científico e o discurso histérico têm quase a mesma estrutura” (Lacan, 1974, p. 523, destaque do autor).

A insatisfação do desejo, ainda que esteja ligada a uma tensão psíquica, não implica ausência de gozo. Na histeria, extrai-se um gozo da privação: goza-se de não gozar. Trata-se de um resto de gozo, que Lacan denomina “mais-de-gozar” por analogia com a mais-valia, de Marx. E o objeto a, na posição da verdade reprimida do discurso da histeria, atesta não apenas a lacuna no sujeito, a causa de seu desejo, mas também o mais-de-gozar. O gozo excedente deriva-se tanto da falta no sujeito quanto da revelação da falta no Outro. E esse modo substituto de satisfação alimenta a insatisfação, faz com que o sujeito histérico se apegue a ela.


Desejo e disjunção de impossibilidade

Ao mesmo tempo que evidencia a falta no Outro, o sujeito histérico oferece-se para tamponá-la, apresentando-se como objeto de seu desejo: “Ela identifica-se [...] a um objeto” (Lacan, 1957-58, p. 407). Chegamos com isso ao patamar superior do algoritmo do discurso da histeria, em que o sujeito ($), na posição de agente, interpela o Outro (aqui representado por S1, o significante-mestre que incide sobre a bateria de significantes), na posição de outro do discurso. Essa interpelação tem o sentido de sedução, de fazer desejar. O sujeito histérico mira o desejo do Outro, questiona incessantemente se o Outro deseja e o que ele deseja, e, a partir daí, propõe-se como o objeto desse desejo. Basta verificar que algo está faltando ao Outro para que ele se empenhe em preencher essa falta, o que lhe confere uma extrema plasticidade. “O sujeito histérico constitui-se quase inteiramente a partir do desejo do Outro” (ibid., p. 365). Seu desejo é subordinado ao desejo do Outro: o que ele deseja em última instância é o desejo do Outro. “O desejo da histérica não é desejo de um objeto, mas desejo de um desejo, esforço para manter-se diante desse ponto de onde ela chama seu desejo, o ponto onde está o desejo do Outro” (ibid., p. 407). Assim, a fórmula do desejo histérico vale para o desejo em geral; o sujeito histérico ilustra por excelência o mote lacaniano “o desejo é o desejo do Outro”. Em face de um parceiro amoroso, por exemplo, a dúvida histérica por excelência não é sobre seu próprio amor pelo outro, mas sobre o amor do outro por si. É a mesma atitude, aliás, atribuída por Freud (1914, p. 105) ao tipo narcisista de escolha objetal: “Sua necessidade não se acha na direção de amar, mas de serem amadas; e o homem que preencher essa condição cairá em suas boas graças”.

No matema da fantasia histérica, que aparece no Seminário VIII e não é retomado ulteriormente, a é o objeto ao qual o sujeito histérico se identifica para ocultar -φ, símbolo da castração do Outro, resultando dessa operação A, o Outro não castrado:


(Lacan, 1960-61, p. 294).

A premissa subjacente a esse movimento é que, se o Outro superasse sua castração (passasse de a A) graças à iniciativa do sujeito histérico, este por tabela superaria também sua própria castração (passando de $ a S).

Para tentar fixar-se como objeto do desejo do Outro, o sujeito histérico tenta enredar o Outro em sua própria trama, fazer o Outro acreditar na possibilidade de adquirir completude através dele. Ao mesmo tempo, serve-se de estratagemas para deixar o Outro insatisfeito: “O desejo só se mantém pela insatisfação que lhe é dada ao se escapar-lhe como objeto” (Lacan, 1960, p. 824). Assim, a bela açougueira impede o marido de oferecer-lhe caviar e, com isso, frustra ao mesmo tempo seu próprio desejo por caviar e o desejo do marido de cumprir seu desejo (o que é natural: se o desejo do sujeito é o desejo do Outro, a insatisfação de um liga-se à insatisfação do outro). Para ser objeto do desejo do Outro, é mister evitar tornar-se objeto de seu gozo. Daí a postura proverbial da mulher histérica, de provocar o desejo do Outro e em seguida se evadir. Ou, mesmo que não se esquive do intercurso com o parceiro, de recorrer a artifícios, imaginando, por exemplo, que é outra mulher que está em seu lugar, ou que ela é outra mulher, ou que ele é outro homem. Ou, ainda, de entreter fantasias em que se coloca como prostituta ou vítima de estupro. De todo modo, observa Lacan (1958-59, 17/06/1959), “para a histérica, não é dela que se goza”.

A incitação para o Outro desejar confronta-se com a disjunção entre as duas posições superiores, marca de todo discurso, designada pelo vetor da impossibilidade. “A primeira linha comporta uma relação que é indicada aqui por uma flecha, e que se define sempre como impossível” (Lacan, 1969-70, p. 202). O vetor aponta da esquerda para a direita, assinalando que, para o agente, expressar exatamente seu desejo para o outro é algo inexequível. O que está em jogo, nesse caso, é a verdade que está barrada, um desejo que, por ser reprimido, inconsciente, não pode ser comunicado em sua inteireza. A impossibilidade não é absoluta, mas indica simplesmente a existência de um limite. Cada discurso gira em torno de uma impossibilidade específica. Numa conhecida passagem, Freud (1925, p. 341) afirma: “Aceitei o bon mot que estabelece existirem três profissões impossíveis – educar, curar e governar”. Mantendo-se o dito tradicional, “Analysieren” aparece subsumida em “Kurieren”; mais tarde, toma seu lugar. “A análise é nova, e Freud a alinha na série por substituição” (Lacan, 1969-70, p. 193). Assim fica a nova formulação, doze anos depois: “Quase parece como se a análise fosse a terceira daquelas profissões ‘impossíveis’ quanto às quais de antemão se pode estar seguro de chegar a resultados insatisfatórios. As outras duas, conhecidas há muito mais tempo, são a educação e o governo” (Freud, 1937, p. 282). O paralelo com os discursos salta aos olhos, nota Lacan (1969-70, p. 194): “Não se pode deixar de ver a sobreposição desses três termos aos que eu distingo este ano”. Assim, as tarefas impossíveis de governar, educar e curar/analisar remetem respectivamente aos discursos do senhor, da universidade e do analista. E, a elas, pode-se adicionar a impossibilidade de “fazer desejar, para completar por uma definição o que seria próprio do discurso da histérica” (ibid., p. 201). Como nos outros discursos, trata-se em última instância de um desejo que não se realiza plenamente; a especificidade do discurso da histeria é que se trata aqui do desejo de suscitar o desejo, e que a insatisfação de um desejo remete à natureza intrínseca da histeria – portanto, a disjunção de impossibilidade tem uma conotação especial nesse discurso.


A impossibilidade de fazer desejar, o limite à sedução, é algo que se coloca para todo sujeito, desde a infância: “O primeiro objeto que ele propõe a esse desejo parental cujo objeto é desconhecido é sua própria perda: ‘Ele pode perder-me?’” (Lacan, 1964, p. 194-195). Todavia, ela aparece com maior intensidade na histeria. Nos primórdios de uma estrutura psíquica histérica podemos encontrar, no vínculo entre o bebê e a mãe, uma sensação de inadequação, de não ser capaz de satisfazer o desejo materno, que está relacionada com a dimensão traumática característica dessa estrutura. Por outro lado, o pai tampouco se mostra à altura de satisfazer o desejo materno, tornando igualmente problemática a via de identificação com ele. A insegurança diante do desejo do Outro persiste no sujeito histérico adulto. Na medida em que presta mais atenção ao desejo do Outro e espera mais do Outro do que seria o usual, ele dá-se conta mais facilmente da impossibilidade de fazer desejar. Até a bela açougueira, embora seja feliz com o marido, que tem preferência por mulheres mais roliças, como ela própria, percebe que ele não tem olhos exclusivamente para ela; com efeito, o açougueiro deixa entrever uma ponta de interesse por sua amiga, apesar da magreza desta. Face à impossibilidade de fazer desejar, essa tarefa transforma-se num verdadeiro repto para o sujeito histérico – ele insiste em agradar, tenta seduzir quem parece inacessível, enfileira uma sucessão de conquistas, quer ser tudo para o Outro, engaja-se enfim num esforço assintótico para completar o Outro. Como observa Freud (1950, p. 287) na carta 72 a Fliess, “ansiar ardentemente é o principal traço de caráter da histeria”.

A interpelação de $ a S1 não se dá somente no registro do desejo, mas também no registro do saber. Além do sentido de sedução, ela tem também o sentido de demanda de um saber: o que o sujeito histérico busca no Outro rebate-se sobre ele próprio, adaptar-se ao desejo do Outro pressupõe no Outro um saber sobre o sujeito. É bastante apropriado que, no algoritmo do discurso da histeria, a posição dominante seja ocupada por $, pois o sujeito histérico é o sujeito dividido exemplar, envolto em dúvida e questionamento. Na forma clássica de histeria, as marcas do significante são exibidas no próprio corpo sob a forma de sintomas, que funcionam como enigmas a ser decifrados, fazendo do sujeito um ponto de interrogação ambulante, uma incógnita a ser interpretada. “No nível do discurso da histérica, está claro que essa dominante nós a vemos aparecer sob a forma do sintoma. É ao redor do sintoma que se situa e se ordena aquilo que é do discurso da histérica” (Lacan, 1969-70, p. 48). Na posição da verdade, daquilo que move o sujeito mas é inacessível a ele, encontramos o objeto causa do desejo (a). O desejo da histérica manifesta-se sob a forma da interpelação, dirigida a um outro, que versa justamente sobre essa verdade à qual a histérica não tem acesso: quem eu sou? o que eu quero? Trata-se principalmente de uma interrogação a respeito da sexualidade e da feminilidade; para Lacan (1955-56, p. 193), a questão primária que define a histeria é “O que é ser uma mulher?” Ao interrogar aquele que se instala na posição do outro do discurso, o sujeito encarrega-o de prover respostas, dá-lhe o condão de conferir sentido às coisas como um significante-mestre (S1). E, com seu questionamento, compele-o a suprir um saber (S2). Não se trata da mera reprodução de um saber estabelecido, como no discurso da universidade, mas de algo novo: “O que conduz ao saber [...] é o discurso da histérica” (Lacan, 1969-70, p. 23). O saber, na posição da produção, tenta dar conta da causa do desejo da histérica, o objeto a. Trata-se, de um lado, da condição de todo sujeito, definido a partir do Outro (nesse caso disposto verticalmente como ); pode-se dizer que o sujeito falante é, enquanto tal, histérico. De outro lado, temos um Outro que, atraído pela perspectiva de completar seu saber, e obturar assim sua falta, caso se revele capaz de solucionar o enigma que o sujeito lhe propõe, se esforça em prover respostas.

O próprio surgimento da psicanálise pode ser entendido no contexto de um desdobramento a partir do discurso da histeria, como um saber suscitado no curso do tratamento de pacientes histéricas por Freud. O questionamento dessas pacientes ($), na posição de agente, leva Freud (S1), na posição do outro do discurso, a produzir o saber psicanalítico (S2), na posição da produção. Cumpre assinalar que, restrita aos confins do discurso da histeria, a demanda de saber se chocaria com a disjunção de impossibilidade. Mas Freud não se propõe a responder diretamente a essa demanda. O saber psicanalítico não é meramente teórico, ele instala um novo dispositivo e provoca assim um giro do discurso da histeria para o discurso do analista, que realoca todos os termos. Esse movimento, que preside o nascimento da psicanálise, é reproduzido em toda análise individual, que implica “a histericização do discurso”, ou seja, “a introdução estrutural, por condições artificiais, do discurso da histérica” (Lacan, 1969-70, p. 35-36). Isso significa que o analisando, independentemente de sua estrutura clínica, deve passar por uma etapa em que ele se posicione como o sujeito histérico, como um sintoma que demanda interpretação, para que se possa estabelecer a análise.

Na medida em que o sujeito se dispõe a preencher a falta do Outro, se subordina ao Outro, ele o entroniza como um senhor. “O que a histérica quer – eu digo isso para aqueles que não têm a vocação, deve haver muitos – é um senhor. Isso é absolutamente claro. A tal ponto inclusive que é preciso colocar a pergunta se não é daí que veio a invenção do senhor” (Lacan, 1969-70, p. 150). Se no discurso do senhor este expropria o saber do escravo, no discurso da histeria é o senhor que é desafiado a fornecer um saber: “A histérica não é escrava. [...] Ela faz a sua maneira uma certa greve. Ela não entrega seu saber. Ela desmascara entretanto a função do senhor com a qual permanece solidária” (ibid., p. 107). A posição da histérica em relação ao senhor é portanto ambígua. Por um lado, ela o comanda, a partir da posição de agente, quando requer dele a produção de um saber, o induz a entrar em seu jogo, oferece-lhe a possibilidade de ser um senhor. Por outro lado, ela depende dele, na medida em que se deixa definir por ele e seu saber. A histérica sustenta o senhor e ao mesmo tempo o desafia, espera dele respostas mas questiona sua pertinência. A impossibilidade de fazer desejar, ou de obter um saber adequado, torna a relação com o senhor inevitavelmente insatisfatória. Ele é permanentemente posto em xeque, seus limites são testados o tempo todo, o que cria uma situação na qual não está claro quem está de fato em controle: “Dito de outro modo, ela quer um senhor sobre o qual ela reina. Ela reina, e ele não governa” (ibid., p. 150). É o caso de Dora, que “crescera acostumada a rir dos esforços dos médicos” (Freud, 1905, p. 20) e que desdenha do empenho de Freud em interpretar seus sintomas. O questionamento contínuo do senhor pode desdobrar-se inclusive na busca por um novo senhor, alimentando um ciclo ininterrupto.

Aqui podemos retomar a analogia entre o modo de funcionamento da ciência moderna e o do discurso da histeria: como o sujeito histérico, o cientista ($), movido por sua curiosidade (o objeto a, causa do desejo), questiona um significante-mestre estabelecido (S1) para chegar a suas descobertas (S2). Para lançar mão dos termos de Kuhn (1962), o discurso da histeria está relacionado à quebra de um paradigma existente, enquanto o discurso da universidade está relacionado à consolidação de um novo paradigma.

Vale lembrar também que, quando Lacan apresenta o esquema dos discursos no Seminário XVII, ainda reverberam fortemente na França os ecos da agitação política de Maio de 68. A própria capa da edição desse seminário chama a atenção para a atmosfera da época, ao exibir uma foto do líder estudantil Daniel Cohn-Bendit (que granjeou o apodo “Dany le Rouge” tanto por ser ruivo como por sua orientação política) diante de um policial. Outro sinal dos tempos é o fato de que Marx aparece aqui como um interlocutor central, ao lado de Freud e Hegel – a maior parte das referências a Marx na obra de Lacan, aliás, concentra-se justamente no final dos anos 60 e começo dos anos 70. E, em duas ocasiões, a fala de Lacan é interrompida por contestações. Numa delas, as luzes são apagadas e ele retira-se. Noutra, um impromptu especial em Vincennes, conhecida então como “universidade vermelha”, os manifestantes engajam-se numa acirrada discussão com ele, transcrita num apêndice. No meio dessa discussão, Lacan (1969-70, p. 239) relaciona o comportamento dos estudantes ao discurso da histeria: “É a isso que vocês aspiram como revolucionários, a um senhor. Vocês o terão”. O próprio Lenin (1918, p. 346) tinha usado essa qualificação num panfleto: “Os esquerdistas e anarquistas são notáveis exemplos de maus revolucionários. Eles estão agora gritando histericamente”.

Podemos ainda associar a construção da sociedade de consumo ao modelo do discurso da histeria. O consumidor, como sujeito dividido, instala-se no lugar do agente, impelido pela falta, no lugar da verdade. Ao questionar a mídia sobre seu desejo, o consumidor toma-a como significante-mestre, na posição do outro do discurso. Esse papel é desempenhado tanto pelo publicitário que atua nos bastidores como pelos modelos utilizados para seduzir o consumidor e pelos alvos que este é encorajado a seduzir. O saber produzido na operação tenta dar conta do desejo do consumidor e, como bateria de significantes, rebate-se sobre o universo das mercadorias. A disjunção de impotência indica que nesse processo há gozo parcial bem como insatisfação, razão para que ele se retroalimente. É verdade, porém, que na contemporaneidade não é mais a falta que define a dinâmica do consumo, o que leva a um reposicionamento da histeria:

“A histeria de nosso tempo se ajusta à forma tornada dominante do saber, a ciência – na medida em que ela se traduz pela eclosão permanente de gadgets que representam numerosas respostas sem questões. Recentemente, alguém de Silicon Valley definiu bem a virada que assume diante de nossos olhos o mal-estar na civilização: ‘O computador doméstico é uma solução sem um problema’. Baseada nisso, a histérica transforma sua essência em questão” (Miller, 1984, p. 6).


No discurso da histeria vemos, no fim das contas, a conjunção de duas disjunções. A disjunção de impotência, isto é, a não-coincidência entre a produção e a verdade, está relacionada com a disjunção de impossibilidade: o outro só conseguiria gerar um resultado compatível com a verdade do agente se pudesse assimilar fielmente esta última através do agente. E, como o efeito do discurso, a produção, não é igual a sua causa última, a verdade, o circuito do discurso jamais se completa, o que o leva a recomeçar a cada turno.


Identificação e fixação nas disjunções

O esquema do discurso da histeria revela a existência de um núcleo histérico no sujeito e no desejo. É a fixação permanente nesse núcleo que dá à histeria uma dimensão patológica. Para entender essa fixação, é importante levar em conta os vetores de identificação na histeria.

O papel da identificação na histeria é salientado por Freud em A interpretação dos sonhos:

“A identificação é um fator altamente importante no mecanismo dos sintomas histéricos. Ela permite aos pacientes expressarem em seus sintomas não somente suas próprias experiências como também as de um grande número de outras pessoas; ela lhes permite, por assim dizer, sofrer em nome de toda uma multidão de pessoas e desempenhar todos os papéis isoladamente numa peça” (Freud, 1900, vol. IV, p. 159).


No mesmo diapasão, Lacan (1998, p. 467) afirma que o desejo da histérica lhe abre “um mundo de identificações que a põe em uma certa relação com a máscara”.

Na medida em que o sujeito histérico se preocupa em entender o desejo do Outro e constituir seu desejo a partir dele, acaba identificando-se com o Outro a ponto de desejar como ele, de tomar seu lugar. A bela açougueira, ao perceber no marido um desejo pela amiga, a despeito de ela não ser do tipo físico que normalmente o atrairia, fica intrigada quanto ao funcionamento de seu desejo: “Não teria ele também um desejo que permanece atravessado, quando tudo nele está satisfeito?” (Lacan, 1958, p. 626). Por isso, ela coloca-se no lugar do marido e deseja sua amiga do ponto de vista dele, de modo a entender seu desejo. “É esta questão que se torna o sujeito aqui mesmo. Em que a mulher se identifica com o homem” (ibid., p. 626). Algo semelhante ocorre com Dora: “É por intermédio do Sr. K. que ela deseja, mas não é ele que ela ama, e sim a Sra. K.” (Lacan, 1960-61, p. 429). A ligação com a Sra. K. não é direta, mas requer um vínculo libidinal com o Sr. K., a assunção por Dora do desejo dele como sendo dela: “Por meio do Sr. K., na medida em que ela é o Sr. K., no ponto imaginário que constitui a personalidade do Sr. K., é como Dora está vinculada com a personagem da Sra. K.” (Lacan, 1956-57, p. 138).

Por outro lado, o sujeito histérico identifica-se com quem compartilha com ele a posição de objeto de desejo do Outro:

“É na medida em que ela ou ele reconhece num outro, ou numa outra, os indícios de seu desejo, a saber, que essa outra ou esse outro está diante do mesmo problema de desejo que ela ou ele, que se produz a identificação – com todas as formas de contágio, de crise, de epidemia, de manifestações sintomáticas que são tão características da histeria” (Lacan, 1957-58, p. 407-408).

No sonho da bela açougueira, especula Freud, talvez ela estivesse fazendo o papel de sua amiga. A partir da posição comum de ambas como objeto de desejo de seu marido, entre elas se estabeleceria uma identificação. E o modo pelo qual se operaria essa identificação seria o desejo por um desejo não-realizado: tal como ela não satisfazia seu desejo por caviar, a amiga não satisfazia seu desejo por salmão.

Embora as identificações histéricas possam dar-se concomitantemente em várias direções, os vetores principais de identificação são o Outro, numa versão degradada (um homem), e o objeto de desejo do Outro (uma outra mulher) (Miller, 1994-95, p. 126-127,209). No triângulo do desejo, “a histérica se reconhece nas homenagens prestadas a uma outra, e oferece a mulher em que ela adora seu próprio mistério ao homem do qual ela toma o papel sem poder gozar dele” (Lacan, 1956, p. 425). Para além das identificações, essas referências externas servem também como alvo de idealização: os marcos no horizonte da histeria são o Pai ideal e a Mulher ideal.

Por um lado, o sujeito histérico sustenta a crença num Outro absoluto, sem falhas, não submetido à castração. Esse Outro é inspirado no mito freudiano do pai da horda primordial, que tem acesso a um gozo irrestrito e cujo assassinato leva à instituição da ordem simbólica. Tratando como uma regra o que é uma exceção, o sujeito histérico espera que cada encarnação concreta do Outro se conforme a esse modelo. Essa expectativa, naturalmente, está fadada ao fracasso, fazendo de cada senhor alguém em falta, insatisfatório. Por trás da idealização do Outro, o que se almeja é um saber que seja capaz de dar conta plenamente do objeto a, negando a disjunção de impotência entre S2 e a.

Por outro lado, o sujeito histérico nutre a crença num objeto de desejo ideal, que em termos lacanianos representa A Mulher, aquela que segundo Lacan não existe, à falta de um significante que dê conta ao mesmo tempo de todas as mulheres, possibilitando que se capte a essência da condição feminina. Caso existisse de fato, A Mulher, como o objeto de desejo perfeito, representaria a negação da disjunção de impossibilidade entre $ e S1, a abolição do limite ao fazer desejar e a obturação efetiva da falta do Outro.

Tanto sujeitos histéricos, do ponto de vista patológico, como sujeitos não-histéricos podem fazer laço social por meio do discurso da histeria. A diferença é que os primeiros se aferram ao questionamento de suas disjunções e, desse modo, se detêm na dinâmica interna do discurso. Isso diminui sua capacidade para deslizar para outros discursos, fazendo com que sua inserção no mundo se dê grande parte do tempo via discurso da histeria. Nesse sentido, não apenas indivíduos, mas também grupos sociais seriam passíveis de funcionar histericamente de forma patológica, na medida em que houvesse neles uma fixação indevida nesse discurso.


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Resumos

Hysteria between the clinic and the social bond

To understand the modus operandi of the discourse of hysteria, the paper proposes to derive its assembly from the characteristics and operation of the hysterical clinical structure. To circumvent the enjoyment, hysteria cultivates dissatisfaction: the lack, in the position of truth, cannot be met by the Other, in the position of production. And, at the same time that she highlights the limitation of the Other, the hysteric offers herself to overcome it: the subject, in the position of agent, places herself as object of desire of the Other, in the position of other of the discourse. As a social link, however, the discourse of hysteria does not necessarily involve hysterical subjects from the clinical viewpoint. What distinguishes the latter is the fact that they cling to the questioning of the disjunctions of impotence, below, and of impossibility, above, and thus become fixed on the internal dynamics of the discourse.

Keywords:
psychoanalysis, hysteria discourse of hysteria, clinical structure, social bond.


L’hysthérie entre la clinique et le lien social


Pour comprendre le modus operandi du discours de l’hystérie, l’article se propose de dériver son montage à partir des caractéristiques et du fonctionnement de la structure clinique hystérique. Pour circonvenir la jouissance, l’hystérie cultive l’insatisfaction: le manque, dans la position de la vérité, ne peut pas être tamponné par l’Autre, dans la position de la production. Et, en même temps qu’elle souligne la limitation de l’Autre, l’hystérique s’offre à la combler: le sujet, dans la position de l’agent, se présente comme l’objet du désir de l’Autre, dans la position de l’autre du discours. Cependant, en tant que lien social, le discours de l’hystérie n’implique pas nécessairement des sujets hystériques sous le point de vue clinique. Ce qui distingue ces derniers est le fait qu’ils s’accrochent à la remise en cause des disjonctions d’impuissance, sur la ligne inférieure, et d’impossibilité, sur la ligne supérieure, et ainsi se fixent à la dynamique interne du discours.

Mots-clés: la psychanalyse, l'hystérie discours de l'hystérie, la structure clinique, lien social.


Citacão/Citation: CASTRO, J.C.L. de. A histeria entre a clínica e o laço social, in Revista aSEPHallus, Rio de Janeiro, vol. VIII, n. 15, nov. 2012 a abr. 2013. Disponível em www.isepol.com/asephallus

Editor do artigo: Tania Coelho dos Santos.

Recebido/Received:
11/01/2012 / 01/11/2012.

Aceito/Accepted:
04/03/2012 / 03/04/2012.

Copyright:
© 2013 Associação Núcleo Sephora de Pesquisa sobre o moderno e o contemporâneo. Este é um artigo de livre acesso, que permite uso irrestrito, distribuição e reprodução em qualquer meio, desde que o autor e a fonte sejam citados/This is an open-access article, which permites unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, provided the author and source are credited.